Arquitetura

Desafios da Arquitetura Sustentável

Nadir Bonaccorso, Arquiteto e doutorando em Arquitetura pela Universidade de Évora, abre o véu sobre os principais desafios da arquitetura no caminho para o verdadeiro desenvolvimento sustentável, partilhando uma breve reflexão sobre o papel da arquitetura e dos arquitetos nesta que se apresenta como uma oportunidade de evolução sem igual.

Estamos a viver uma época delicada e perigosa que, quer o aumento da população e da pobreza, o esgotamento dos recursos naturais existentes, as emissões de gases com efeito de estufa na atmosfera, como a própria recuperação da pandemia Covid-19, e a crise energética a par com a recente guerra na Ucrânia, nos obriga a refletir sobre o Nosso futuro. As alterações climáticas, consequência da ação humana no território, são realidades anunciadas, oficialmente, desde 1972, durante a primeira conferência das Nações Unidas sobre o ambiente em Estocolmo. Desde então, num planeta desigual, pequenos e insuficientes passos foram dados para reverter os seus efeitos, continuando a preferir-se o business as usual em todos os domínios disciplinares, cujos custos efetivos são sentidos atualmente. Em abril de 2021, e apesar dos efeitos da pandemia na indústria e no mercado global, que provocou uma redução de cerca de 7% nas emissões de gases, registou-se a maior concentração de dióxido de carbono na atmosfera desde 1958, altura em que começou a ser medido. As análises do gelo polar revelaram que, concentrações iguais às atuais, remontam há mais de 800.000 anos.

A pergunta que surge, como arquiteto, é: a arquitetura está preparada para este desafio?

É de conhecimento público que os edifícios consomem cerca de 40% da energia global produzida, contribuindo para 1/3 das emissões de gases na atmosfera. Sabemos que as previsões de aumento demográfico até 2050, para 9.7 mil milhões de pessoas, com uma tendência de maior aglomeração nas cidades, implicará mais edificação e mais consumo. Sabemos que a maioria da energia que usamos é finita e poluente e que os países desenvolvidos são os maiores consumidores. Sabemos que por cada tonelada de betão produzida (e produzimos mais de 20 mil milhões por ano) emitimos perto de uma tonelada de dióxido de carbono para a atmosfera, embora já existam soluções integráveis na construção. Sabemos que uma boa orientação solar e uma boa construção permitem diminuir os consumos energéticos e aumentar o conforto nos edifícios (e temos hoje conhecimento e ferramentas que nos permitem avaliar um projeto, simulando as suas necessidades energéticas e o seu impacto no ambiente). Sabemos que a investigação na área da arquitetura e das engenharias é necessária e continua a precisar de mais estímulos e apoios. Sabemos que o projeto de uma cidade, de um bairro ou de um edifício, no Ocidente, é um trabalho multidisciplinar que responde a um programa e ao desejo do cliente, público ou privado. Sabemos que este desejo, de alcançarmos uma sociedade mais responsável, democrática e justa, precisará de novos procedimentos de administração pública (espelho das necessidades coletivas) e privada, com claros objetivos, abertos a todos, transparentes, na procura da melhor solução para a cidade, apostando não só nos resultados, mas também nos processos. Sabemos que para a construção de um novo modelo de habitar o território (porque é disto que precisamos), o próprio conceito do tempo não pode estar só vinculado a questões políticas e de financiamentos, mas sim a objetivos de médio a longo prazo.

Sabemos que não poderemos mudar a situação atual, resolvendo os problemas localmente, sem atuar com a mesma determinação em todo o nosso planeta. E sabemos mais…

Sim, a arquitetura e os arquitetos têm um grande contributo a prestar, pois “É certo que a arquitetura depende dos factos, porém o seu verdadeiro campo de atividade expande-se nos significados… não tem nada a ver com a invenção das formas […] A arquitetura depende do seu tempo. É a cristalização da sua estrutura interior, o lento desdobrar da sua forma” (L. Mies Van de Rohe, Arquitetura e tecnologia, 1950). Contudo o desenvolvimento sustentável deve ser um desejo coletivo e este “anseio de nos ultrapassarmos a nós próprios tem de ser instintivo e não teórico ou meramente acreditável” (Henry Miller), para não corrermos o risco de que a palavra tenha mais importância do que o seu significado. Não podemos perder esta oportunidade de evoluir!

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